Episódios relacionados à discriminação racial são relatados e criticados com freqüência em blogs, listas de discussão, mesas de bar, salas de reuniões, enfim, nos mais diversos ambientes. Todos estamos cansados de saber que vivemos num país racista, que tenta se nutrir de um discurso de democracia que não se sustenta mais, ancorado no mito do mestiço ideal.
Como disse o Prof. Kabenguele Munanga numa entrevista, é muito difícil definir quem é negro no Brasil. Ser ou não ser negro, muito mais que uma questão de pele, é uma questão de identidade, de concepção política e ideologia. Esta é uma sociedade que discrimina o afro-descendente e afirma que somos “uma minoria”. Como assim? Representamos quase a metade ou mais da população brasileira! Esse discurso se ancora no mito da democracia racial, que ganhou força no século XX e encobre o preconceito brasileiro.
A identidade da pessoa negra traz do passado o estigma de ser coisificado, inferiorizado e ter sua tradição e seus valores negados. Tendo em vista que o ser humano está num constante construir-se e que nossa identidade é forjada em torno de referências segundo as quais o indivíduo organiza a si mesmo e sua relação com o mundo que o cerca, pode-se considerar que a (re)afirmação de uma identidade negra se dá paulatinamente.
Muitos de nós já passou pelo estágio da “submissão”, caracterizado pela “incorporação” de valores externos, que dão força à dicotomia branco=bom X negro=mau. A escola é a grande mestra nesse processo. Assim, meninos e meninas que foram alienados, assimilados, aculturados, se tornam adultos que não se reconhecem; que não conseguem se enxergar e se autodiscriminam ao discriminarem semelhantes. A imagem da suposta "loira" com a plaquinha ilustra bem isso. Ao anunciar: "Meu marido é preto", ela, automaticamente, afirma sua identidade branca e a aceitação do outro - o marido negro - como um símbolo da convivência harmoniosa, pacífica e feliz com o "diferente". A apropriação de valores externos determinam como ela se vê (e não se percebe!).
O nosso sistema educacional sempre priorizou a cultura européia e a existência das leis atuais não mudou isso. A cultura negra continua sendo tratada em segundo plano e para fazer valer a aplicação das leis 10639/03 e 11645/08, é preciso brigar muito.
A tomada de consciência é gradual e emerge da não funcionalidade do valor do branco como referência, gerando a necessidade de identificação com uma “nova” forma de ver o mundo. Essa tomada de consciência gera um impacto emocional que muitas vezes é refletido em atitudes radicais, como se existisse uma necessidade de externalizar ao extremo essa nova consciência, assim, o corpo, cabelo, vestimenta, tudo passa a ser um símbolo da identidade negra. Mais uma vez uma dicotomia se instala: Branco=mal X Negro=bom. Muitas vezes esse impacto se dá através de uma situação dramática particular ou pela sucessão de pequenos episódios que vão desnudando o racismo e revelando sua face cruel.
A militância surge nesse contexto como uma resposta à crise, e é seguida por um processo de articulação de experiências. É a necessidade de demolir as velhas estruturas e construir novas bases que conduzem a uma articulação do senso de negritude e leva ao desenvolvimento de uma perspectiva de vida afrocentrada, voltada para a valorização da cultura africana na construção de uma identidade negra.
Como se vê, é tudo uma questão de identidade.
Aline Najara Gonçalves
Prezada professora Aline,
ResponderExcluirVenho apresentar meu artigo que falo sobre os temas básicos de seu blog: a linguagem na educação; a história do racismo e os esforços para erradicação do racismo.
Fique à vontade caso queira publica-lo, é parte da nossa luta contra o racismo com uma visão crítica sobre a identidade ´racial´ dos afro-brasileiros que entendo ser prejudicial se submetida à ´raça negra´. A nossa cor humana é de pretos e pardos. ´Negro´ é raça.
abraço, J. Roberto Militão
" “ PRETO é cor; a “raça” é negra”? Alimentando o ovo da serpente.
No combate ao racismo é imperiosa a desconstrução da linguagem de pertencimento racial. No espaço de uma semana, em dois tópicos, sucessivos e concorridos debates na internet sobre racismo no portal LUIS NASSIF ocorreu o uso abusivo em mais de duzentas vezes, da classificação racial dos pretos e pardos na condição racial de “negros” (`19/02, ´Preconceito sutil é mais forte e perpetua o racismo´; e 18/02, ´O DNA dos “Negros” e Pardos brasileiros´,) http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/preconceito-sutil-e-mais-forte-e-perpetua-racismo.
Ficou obvio o uso da linguagem racialista é fonte do racismo que queriam combater. O perfil dos debatedores, sem dúvida, é de humanistas não racistas. A maioria reconhece a contundência do racismo sutil, tão bem exposto no texto de ANA MARIA GONÇALVES denunciando o cartunista ZIRALDO, com provas textuais, da prática do racismo na linguagem que uniu, com o intervalo de um século, dois expoentes da literatura infantil: ZIRALDO do sutil ´Menino Marron´ resolveu sair às ruas no carnaval de 2011 determinado a propagar a defesa pública da literatura com odiosa pregação racista e eugenista de MONTEIRO LOBATO, mentor intelectual de um plano de genocídio da raça negra proposto no livro ´O Presidente Negro´, a “solução final” para erradicar a “raça inferior”. http://www.cartamaior.com.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=4967.
Na condição de escritores para crianças, ambos utilizaram com maestria da poderosa arma da linguagem para a sedução às suas crenças, da fértil mente e frágil alma. ARISTÓTELES, em a Política, afirma: somente o humano é um "animal político", isto é, social e cívico, porque somente ele é dotado de linguagem. Os outros animais possuem voz e com ela exprimem dor e prazer, mas o humano possui a palavra (logos) e, com ela, exprime o bom e o mau, o justo e o injusto. Exprimir e possuir em comum esses valores é o que torna possível a vida social e política e, dela, somente os humanos são capazes. É isso: a linguagem capacita o homem, para o bem ou para o mal. A identidade política da ´raça negra´, em vez da cor preta, expresso no slogan, é uso perverso e irresponsável da linguagem que consolida a crença racial, semente de mais e mais racismo. Qualquer identidade racial é odiosa..."
continua aqui:
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/o-ovo-da-serpente-da-linguagem-racialista
Para o Globo que publicou esta foto com grande destaque (Globo e Extra), e olha que se ninguém disser, não se sabe que é um dia de carnaval. Para este tipo de mídia o negro é um consumidor indireto sem identidade (e sem cidadania. Desde a construção de um universo infantil até a novela da Globo o negro segue numa desconstrução de sua identidade o que hoje (já) fere preceitos constitucionais até a falta de regularização das leis do ensino afro e indígena.
ResponderExcluirAline, você elaborou um excelente texto. Está mostrando a consciência que muitas outras negras pelo Brasil afora poderiam e deveriam ter.
ResponderExcluirNEGRO é o nome do grupo étnico de todos os brasileiros pretos e pardos. Contudo, eu me sinto melhor quando se referem a mim como negro, ao invés de preto. Não que haja algo errado com a palavra preto; é apenas uma preferência minha... Os brasileiros pretos e pardos foram classificados na mesma etnia porque, de fato, são da mesma etnia, pois existe toda uma afinidade genética e antropológica, e não apenas social e econômica como já vi em alguns sites sem compromisso com a verdade por aí.
Mas a classificação NEGRO só incomoda a dois tipos de brasileiros: Incomoda aos negros com problemas de auto-aceitação, que não se conformam em ser classificados como negros. E incomoda aos brancos racistas, que não se conformam com as cotas e outras ações afirmativas para emancipação do povo negro. Estes, por sua vez, tem tentado desestimular os negros a se unir, dizendo que não devemos ter identidade porque identidade é sinal de racismo. E isso é muita desfaçatez, porque as classes dominantes têm grande apreço por sua identidade branca, mas tentam eliminar do Brasil a nossa identidade negra... A identidade que nos dá dignidade e força pra lutar.
Na verdade, o sentimento de pertencimento não representa mal algum. O mal está em um povo se julgar como superior a outro. E foi o sentimento de superioridade dos europeus do passado que os fez pensar que tinham o direito de tirar pessoas da África para escravizá-las aqui nas Américas... E agora, mais de 120 anos após a abolição, quando os negros brasileiros estão finalmente se organizando para lutar por melhores condições de vida, e para reverter estereótipos que prejudicam a nossa auto-estima; aparece o termo ‘racialismo’: termo inventado pelas elites para menosprezar a luta contra o racismo, que ainda persiste na sociedade brasileira.
O NEGRO DA CASA (José Roberto Militão) tenta convencer a população negra a não ter identidade... Manipulação, mentiras e exageros é o que não falta em seu texto. Um dos grandes exageros é a idéia de que a troca do termo NEGRO por PRETO vai resolver o problema do racismo e da berrante desigualdade entre brancos e negros no brasil.
Axé e felicidades pra você, negra linda!
Obrigada pela colaboração e pela gentileza ao final do texto! Continue visitando o blog para enriquecer nossa proposta, ok?
Excluir"Um sorriso negro... um abraço negro" pra vc!