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quarta-feira, 14 de abril de 2010

LEITURA E LITERATURA NO ENSINO DA HISTÓRIA: Uma relação possível



A ascensão da burguesia no século XVIII viabilizou a oportunidade de disseminação do saber através da leitura e da escola. Naquele momento a Literatura foi introduzida no ambiente escolar como um elemento a mais fundamental ao processo de formação do indivíduo que, conseqüentemente, passou a ser concebido como indivíduo-leitor, desde que houvesse preocupação e cuidado em não descaracterizar a Literatura a ponto de o aluno criar resistência e aversão ao ato de ler.
Neste sentido, o trabalho do educador é fundamental quando se trata da formação de leitores no espaço oficial – a escola –, visto que cabe ao educador apresentar, orientar e dinamizar a prática da leitura, oportunizando ao educando – leitor principiante – o desenvolvimento do hábito de ler como uma opção a mais de lazer e entretenimento.
Em Pedagogia da Autonomia, Paulo Freire deixa claro que a docência é uma atividade que exige rigorosidade metódica, dedicação, respeito, criticidade, dentre outros saberes necessários à prática educativa. Por meio desta obra, Freire propõe uma “reflexão acerca da prática educativo-progressista em favor da autonomia do ser dos educandos” (FREIRE, 1996, p. 13). A busca por uma pedagogia que possibilite a formação de sujeitos autônomos e conscientes do seu papel social tem sido constante para muitos educadores, destacando aqui os professores de História, refletindo-se numa inquietação que os leva a questionar velhas práticas metodológicas do ensino da disciplina. Neste contexto, a fusão entre leitura, Literatura e o ensino da História é, antes de qualquer coisa, uma possibilidade de repensar a metodologia aplicada em sala-de-aula a caminho da valorização da leitura e da produção do conhecimento, a fim de romper definitivamente com o modelo tradicional de educação bancária, de mão única, que aliena o educando e o impede de desenvolver o seu potencial de criticidade.
Rafael Ruiz, em Novas formas de abordar o ensino da História (RUIZ, 2004, p. 75-91), apresenta três modelos possíveis a serem seguidos, no campo História, por professores e historiadores: o primeiro concebe a História como uma grande mestra que educa com exemplos; o segundo aponta a História como um processo contínuo e por fim, o terceiro modelo que prioriza o presente em detrimento dos acontecimentos passados. Embora estes três modelos dialoguem com o processo de renovação na historiografia — que já compreende que os fatos não falam por si — não conseguem mais dar conta da dinâmica da História em sala de aula.
O ensino da História tem passado por transformações que vão desde o modo como o aluno a encara enquanto disciplina ao método utilizado por profissionais da área de educação que, em alguns casos, buscando acompanhar as mudanças tecnológicas da contemporaneidade acabam negligenciando o processo de ensino e aprendizagem em prol da velocidade na transmissão de informações, num espetáculo recheado de técnicas e aparelhos de última geração e, por vezes, pouco conhecimento.
Jaime Pinsky e Carla Pinsky, em História na sala de aula, afirmam:
(...) Na sala de aula, o pensamento analítico é substituído por “achismos”, alunos trocam a investigação bibliográfica por informações superficiais dos sites “de pesquisa” pasteurizados, vídeos são usados para substituir (e não complementar) livros. (PINSK, 2004, p. 17-36)
Em artigo intitulado Por uma História prazerosa e conseqüente, estes autores destacam ainda o desinteresse pelo conteúdo, pela erudição e pela leitura, que foram afetados pelo simplismo tão presente no ambiente escolar e que tem demonstrado a necessidade de reelaborar metodologicamente o ensino da História, agregando ao conteúdo a responsabilidade social e o prazer em lecionar e aprender.
É notória a importância da História na formação social do indivíduo, bem como é importante compreender o potencial transformador do livro e, conseqüentemente, da leitura. Pierre Bourdieu, em diálogo com Roger Chartier convence o leitor de que “por meio de um livro se pode transformar a visão do mundo social e, através da visão de mundo, transformar também o próprio mundo social” (CHARTIER, 2001, p.243). Em outras palavras, a leitura permite a reelaboração de conceitos e posturas acerca da realidade em que se vive, dado o seu caráter plural, uma vez que a leitura de um único texto permite múltiplas interpretações decorrentes do grau de recepção leitor em relação ao livro e do poder sobre o poder que o livro exerce no leitor.
Neste sentido, o primeiro passo no caminho da introdução da leitura e da Literatura no universo do ensino da História é, à luz das idéias de Jonathan Culler em Leitores e Leituras, compreender e questionar o sentido de determinada obra e, a partir daí estabelecer uma relação entre ficção e História que permita encontrar na primeira um caminho para uma compreensão prazerosa da segunda.
História, Leitura e Literatura são áreas que dialogam e se complementam. O estudo da História permite o entendimento da dinâmica das transformações humanas; o conhecimento além dos fatos, do contexto no qual se inserem. Ao conceber a História como uma ciência que pretende estabelecer uma relação entre o passado e presente, é perceptível que o contexto dos acontecimentos deve ser potencializado em detrimento dos fatos e/ou sujeitos isolados. A fusão entre História, Leitura e Literatura permite a apropriação e até mesmo a recriação de emoções e experiências vividas. Desse modo, desde que seja encarada como uma representação da realidade que retrata, a Literatura torna-se uma fonte histórica de grande valor.
Estreitar a ligação entre História, leitura e Literatura como recurso pedagógico torna o ofício do educador mais prazeroso, visto que a Leitura permite ao educando trazer os textos para a sua realidade, inserindo elementos deste em suas experiências cotidianas e a Literatura, por sua vez, dada a sua preparação para o público, seduz e agrega mais que a explanação pura e simples de conceitos e fatos históricos.

Bibliografia:
BARBOSA, Francisco de Assis. A vida de Lima Barreto. 9 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2003.
BARRETO, Lima. Os Bruzundangas. 3ª edição. 9ª impressão. São Paulo: Ática, 2005.
______________. Um sonho do futuro: diários, cartas, entrevistas e confissões dispersas. Rio de Janeiro: Graphia Editorial, 1993. (Série Revisões;5).
CARVALHO, José Murilo de. A Formação das Almas – O Imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
CARDOSO, Fernando Henrique (et al). O Brasil Republicano – Estrutura de poder e Economia (1889-1930). Vol. 1. 6 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.
CHARTIER, Roger & BOURDIEU, Pierre. A Leitura: uma prática cultural. Debate entre Pierre Bourdieu e Roger Chartier. In: CHARTIER, Roger (org.) Práticas de Leitura. Tradução de Cristiane Nascimento. 2 ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2001.

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